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Artigo científico aprofunda estudos sobre crocodilo que viveu há mais de 80 milhões de anos no noroeste paulista

Publicado: Quinta, 14 de Março de 2024, 16h54 | Última atualização em Sexta, 22 de Março de 2024, 11h41 | Acessos: 1227

O animal era carnívoro, quadrúpede, de até quatro metros de comprimento e podia chegar a 80kg


Fóssil encontrado em 2010 no Ribeirão Jagora, em Fernandópolis-SP, em comparação a um baurussuquídeo da espécie Gondwanasuchus scabrosus [Imagem extraída do periódico "The Anatomical Record"]


O crocodilo pré-histórico batizado cientificamente de Baurusuchus pachecoi foi habitante do atual noroeste paulista há 80 milhões de anos, quando na flora da região predominavam as plantas sem frutos (gimnospermas e pteridófitas), não havia grama e o clima era quente (semi-árido). Predador terrestre de primeira linha, teve um ancestral que viveu no supercontinente da Gondwana, que se fragmentou em América do Sul, África e Oceania.

Em 2010, antes de ingressar na então recém-criada Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica (Rede EPC&T), o professor de biologia Carlos Eduardo Maia de Oliveira e um grupo de pesquisadores encontraram em Fernandópolis-SP um fóssil da espécie, que viveu na época dos dinossauros. Na condição de doutor em Geologia Regional, procedeu com a escavação e transporte do material à Universidade de Brasília (UnB), onde permanece até hoje sob sua tutoria e disponível para pesquisas de novos mestrandos e doutorandos de todo país. "Foi o último fóssil que transportei na caminhonete do meu pai, cinco dias antes de seu falecimento. Tenho um carinho especial", revela.

No Laboratório de Paleontologia de Dinossauros e Afins (LaPaDa) da universidade, o fóssil do período Cretáceo Superior teve sua anatomia craniana (cabeça) e pós-craniana (corpo) tomografada e segmentada em 3 dimensões (3D). O resultado da pesquisa identifica as mudanças ósseas e musculares decorrentes do amadurecimento do animal e foi publicado neste mês na revista “The Anatomical Record”, da Sociedade Americana de Paleontologia, referência internacional para a área. O trabalho decorre de projeto de pesquisa de doutorado de Daniel Martins Santos (UnB), concluído em novembro de 2023.

 

Fernandópolis-SP está na Formação Adamantina do Grupo Bauru [Imagem extraída do periódico "The Anatomical Record"]


O professor Carlos Eduardo ressalta que o fóssil do baurussuquídeo juvenil encontrado por ele, Rodrigo Miloni Santucci e Marco Brandalise de Andrade, ambos da UnB, em 2010, é um dos exemplares mais completos já prospectados, faltando apenas a parte da cauda. O material está catalogado como IFSP-VTP/PALEO 0003 (juvenile), pois o docente quis homenagear a instituição em que trabalha desde 2014.

Os três pesquisadores se conheceram em 2004 e cooperam institucionalmente, tendo alcançado 8 publicações em periódicos internacionais, incluindo a mais recente. A primeira, em 2011, é especial para Carlos Eduardo porque é resultado do seu doutorado e porque teve a colaboração revisional do renomado paleontólogo escocês Michael Benton, que  já atuou como consultor científico da emissora pública de televisão britânica BBC. No artigo, o material analisado foram ovos de crocodilomorfos encontrados em Jales-SP. “Ovos preservados são raríssimos, e descobrimos a maior concentração do mundo desse tipo de fóssil, que chamamos de Bauruoolithus fragilis”, explica.

 

No LaPaDa (UnB, Brasília-DF), em 2012, Rodrigo Santucci (de verde), doutorando Daniel Fortier (de azul), Marco Brandalise, Carlos Eduardo e professor Danilo Arruda Furtado, da UnB, Campus Planaltina (em pé) [Fotografia: acervo pessoal)


Desde então, a pesquisa coletiva avançou e concentrou 6 publicações entre 2018 e 2021, explorando os ovos, ninhos, dentes e as fezes fossilizadas, nomeadas no meio científico como coprólitos. A análise química das fezes do Baurusuchus pachecoi, por exemplo, aferiu a elevada concentração de nitrogênio, presente em proteína animal, evidência científica que identificou o regime alimentar carnívoro da espécie, que era terrestre e não semiaquática como os crocodilos que vivem hoje. “Tinham membros locomotores alongados e não curtos com os dos crocodilos atuais, visão binocular e dentes somente na região anterior das maxilas, ou seja, na parte da frente da boca”, detalha Carlos Eduardo.

 

Paleodesign de Felipe Alves Elias, ilustrando um Baursuchus pachecoi diante de predador de grande porte [Imagem extraída do periódico "The Anatomical Record"]


A espécie foi descoberta em 1945 e homenageia o paleontólogo brasileiro Jovino Pacheco, o primeiro a avistar o material fóssil que seria caracterizado por Llewellyn Ivor Price. O termo “Bauru” faz menção aos afloramentos rochosos do grupo Bauru, onde foi encontrado.

 

Atuação no IFSP e região

Professor Carlos Eduardo defronte a um crânio de Baurusuchus pachecoi descoberto em 2021 [Fotografia: acervo pessoal]


Em 2015, o professor Carlos Eduardo orientou projeto de Iniciação Científica (IC) que buscou por rochas sedimentares que revelassem fósseis nos municípios de Votuporanga-SP, Fernandópolis-SP e Jales-SP. Com fomento pelo Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica, o PIBIFSP, o estudante Lucas Diego de Oliveira Rodrigues, do curso Técnico em Manutenção e Suporte em Informática Integrado ao Ensino Médio, colaborou com as explorações e prospecções na região, resultando em exposição de fósseis no evento institucional Casa Aberta, ocorrido durante a programação da Semana Nacional de Ciência e Tecnologia (SNCT) daquele ano, despertando a curiosidade dos visitantes.

O docente tem realizado palestras em escolas da região para destacar a riqueza paleontológica do noroeste paulista e a importância da preservação de fósseis, mobilizando o seu acervo pessoal itinerante. No curso de Engenharia Civil do Campus Votuporanga, Carlos Eduardo ministra a disciplina de Geologia, procurando conscientizar os estudantes sobre a descoberta e resgate de fósseis durante obras na construção civil, a exemplo de estradas e pontes.

Em 2020, durante a pandemia do novo coronavírus, orientou o Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) de Victória Pupim Luchetta, graduanda em Engenharia em Civil, cujo objetivo foi mapear a geodiversidade da região em raio de 150Km a partir de Fernandópolis-SP. O resultado foi disponibilizado ao técnico ambiental do Ministério Público do Estado de São Paulo (MP-SP), Celso Graminha, que foi co-orientador do trabalho. “Aliás, o projeto foi um pedido especial daquele servidor que nos solicitou um inventário das feições geológicas regionais a fim de facilitar o trabalho do Ministério Público no processo de fiscalização”, detalha.

 

Estudantes da disciplina de Geologia do curso Engenharia Civil em Visita Técnica a uma mineradora em Monções-SP em 2019, acompanhados pelo professor Carlos Eduardo [Fotografia: acervo pessoal]


Caso alguém encontre fósseis em rochas na região noroeste paulista, a recomendação é de que se procure o Campus Votuporanga para se providenciar a coleta adequada por especialista, de modo a se evitar avarias no material. “A legislação brasileira proíbe o comércio de fósseis, além da sua guarda em propriedade particulares. Os fósseis sempre devem ser doados a museus e instituições de pesquisa”, destaca o professor e pesquisador que pretende constituir um acervo paleontológico no IFSP.

Segundo o docente, a implementação do laboratório “maker” do campus permite que se projete a impressão de fósseis, via impressora 3D, para uso pedagógico. Enquanto isso, nos cursos de Ensino Médio Integrado do Campus Votuporanga, sua trajetória de pesquisa em paleontologia é mobilizada para abordar a evolução da vida no planeta.

 

Professor Carlos Eduardo em prospecção fóssil [Fotografia: acervo pessoal]


 

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